sexta-feira, 16 de março de 2012

Será que Fernando Pessoa conhece bem todas as suas pessoas como conhece a minha?
Será que ele me emprestaria Bernardo Soares,
Ou, ao menos, me pintaria na personalidade do patrão Vasques?

Se eu o tivesse, daria forma a minha vontade.
Se eu o fosse,
Seria inacção, sonho e solenidade.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Quarta-feira, 14 de março de 2012.



Capricho da imaginação.
Carrego a cidade nos olhos, e só uma pessoa a atravessa sem pedágio, sem prestígio, sem nada.
As imagens, as viagens de ontem - rua afora- são as minhas nostalgias de hoje. Como me apego às paisagens! Nos olhos, elas ainda são reais, têm vida, verde, fumaça e amargura.
A cidade é a minha crença. Não sei crer muito sem utilizar os sentidos ou a fatalidade das coisas. As casas dela são abrigos de sensações que não se abrem a pouco custo - são trancadas com o prazer inenarrável da escrita, da vontade plena de caber num verso, do efeito subjetivo da literatura. Cada cenário é uma contemplação distinta a ser perfeitamente zelada.
Menos eu mesma, embebo o coração de calma. Entretenho-me, e esqueço que sou pessimista (mas deixo o esquecimento à diligência da minha sensatez que há de voltar). Compro a passagem para visitar uma alma mais extensa que os olhos - e mais exausta também.
Gozo a tarde, a solitude e a vazão. Vivo as substâncias dos textos e subsisto em outro lugar longínquo da realidade direta, mas idêntico àquela pela qual as minhas prateleiras comportam.




(É claro que se hoje não me descrevi dentro de mais um dia, é porque... Ora, foi só mais um dia).

terça-feira, 13 de março de 2012

Terça-feira, 13 de março de 2012.

É, achei que não conseguiria escrever hoje.
Apesar dele, acordei querendo escolher uma roupa diferente, querendo me sentir bonita. Nunca fui de demorar para escolher roupa, e me maquiar, me pentear... – e fazer isso tudo de novo uma quantidade infindável de vezes, enquanto me olhando no espelho -, mas logo cedo me incomodei com as pontas do meu cabelo, e saí acertando-as com a minha tesourinha de cortar papel.
Do meu momento de vaidade até o momento em que eu quase fui atropelada (por atravessar a rua, correndo, para pegar o ônibus de costume), não aconteceu nada, para mim; não vi o dia passar.
Cochilei um pouco no ônibus, e quando acordei tinha uma joaninha (única miniatura voadora que não me causa repugnância) próxima à minha janela. Abri mais a janela, para aumentar a chance de ela conseguir sair – e ela saiu, como supunha que aconteceria.
A “Tram” e o meu professor de Direito me fizeram rir como nunca – meu professor, com o seu torcicolo, e a “Tram” com a sua cara de pau.
Depois de comer, ler e conversar durante a tarde, à noite tive mais uma aula de iniciação científica que, diga-se de passagem, embora pouco rentável, me deixou desesperada para estudar – tenho um certo  medo, por razões praticamente óbvias, do meu orientador.
Foi um dia longo e um dia meio vazio, meio cheio, sabem? – como os copos de água enchidos por alguém que não sente nem muito calor nem frio (e assim mesmo toma no frio para engolir melhor o remédio).
O meu remédio foi ignorar o meu lado piegas, não dar muito espaço (nem tempo) a atos involuntários, manifestações irracionais.
Choveu, enquanto eu esperava meu pai ir me buscar na saída da faculdade. Até os pingos de chuva caíam assim... sem algum impacto. Só agora, deitada na cama, esperando pensar em algo fiel a se escrever sobre qualquer ponto do meu dia e de mim, é que a chuva vem para me fazer efetivamente sentir - e  me fazer inundar.
... É.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Segunda-feira, 12 de março de 2012.


Parece que acordei em outro corpo; dormi mal, todo ele doía.
Com os olhos mal abertos (ainda depois de um banho bem tomado), coloquei uma calça jeans clara, uma blusa branca, de X nas costas, e um sutiã vermelho que não acompanhava o modelo da blusa. Depois de andar de um lado para outro, descalça, pela casa, calcei meu all star velho – e, dentro desse vestuário “blusa, calça jeans e all star” estava eu, em comunhão comigo.
Olhei-me no espelho, não vi nada além do de sempre: As pálpebras exageradamente inchadas ( e que, dessa vez, eu não tentei esconder com o meu “gel suavizante de olheiras” pouco útil); e os olhos... ah, nem preciso falar dos olhos, né? Contavam não só a noite mal dormida, como também que não tinham nada para contar.
Minha mãe logo entendeu o que eu nem havia dito, e fez o que pôde: Substituiu o café, da garrafa térmica, pelo suco de maracujá.
E no caminho de casa para a faculdade, meu pai me levava falante tentando me distrair com as suas histórias que têm lições de moral quase sempre envolvendo idoneidade.
No ponto de ônibus, de tão acostumada a receber uma mensagem de “bom dia” por volta daquele horário, senti meu celular vibrar, mas não era nada.
Fiquei lembrando o meu professor explicando o que significava dissonância cognitiva e associando a minha situação ao significado – confessei a mim, não me adaptar, com facilidade, às transformações.
Já sentada ao lado da janela do ônibus, meus cabelos, ainda molhados, bagunçavam-se ao redor do meu rosto. E a mochila no colo, não tirava o peso dos ombros.
Só quando cheguei na praça de alimentação da faculdade, tomando um café (expresso, dessa vez), fraquejei - quisera estar aonde eu moro; bater na porta do apartamento 63 e deitar a cabeça no ombro do Thã.
Até que, subitamente, desliguei-me dos meus pensamentos com uma voz que começou dizendo:
- Olá, Fernanda, você está bem?

quinta-feira, 8 de março de 2012

Ao menos escrevo.





Continuo fria e dispersa. Colocara a culpa no medo, agora coloco na covardia. Nada se aproxima dos planos de menina, nem dos planos “menos menina”. E o que eu queria era ter palavras para mentir que estava vedada e não vi as coisas acontecem (nem vi a verdade contida nos meus anseios).
Desejava namorar alguém que me fizesse explodir de paixão (desatada em olhos alheios). Desejava ter ciúmes. Desejava morrer de ciúmes, sem bem conseguir dormir; pasmar de amor, sem conformismo e com ingenuidade; passar dia, noite, e madrugada com o pensamento preso, em horas soltas; roer as unhas de ansiedade para aquele alguém chegar, de ansiedade para saber se o futuro imitará o presente na sensação de que, todos os dias, a felicidade será buscada, ainda que dolorosamente. Desejava ser castigada pela força de vontade em não esmorecer.
Desejava imaginar coisas ridículas; não perder traços de ímpetos infantis enquanto (incomensuravelmente) apaixonada. Desejava dois minutos de apreciação, depois de horas de saudade.
Desejava, e desejava tanto. Mas não esperava que o desejo precisasse ser confeccionado com as minhas mãos.
Não esperava lágrimas de espera -  de espera vazia (mesmo depois das lágrimas). Não esperava o costume dos meus olhos e o compensar do meu coração; que a mágoa viesse seca a ponto de ser narrada e escrita no papel, e que atribuiria a culpa do meu mau desempenho, frente ao que aspiro, a mim mesma!
            Não esperava que minhas metas tornariam-se objeções vivas, vivas e latentes, racionais e distantes. São tão minhas as metas... Não porque são únicas, mas porque os sintomas, as reações que causam, são tão minhas!
O presente nada mais é que uma oportunidade de projetar o que há de vir. O presente que não é uma condição para o futuro, não é o meu tempo. É minha náusea.
Sinto-me livre, porque já vivi acorrentada à angústia de dizer - ainda angustio respostas pendentes com esforços que não bastaram para alcançar os desejos graves e intensos, sem repouso, sem ornamentos.
Esperava, pois não tivera hora marcada com os acontecimentos.
Agora é sim, ou não: Nada entre, nada mais.


domingo, 4 de março de 2012

A noite.

O olhar contornado pelo dia e, o recorte dele, desperto à noite - noite que sussurra o sono que sonha rasteiro e que resiste a você.
O relógio apita de hora em hora o tempo que vai; o tempo que se esvai fora destas linhas.
A madrugada toda e eu fumando o café, tomando o garoto em palavras de gole em gole.
Pasma, porque não traduzo o meu silêncio para além de três frases e uma oração, o mesmo silêncio parece ensaiar o paladar, para a chegada de algum outro significado emudecido, vindo da garganta.
Toda a abstração do mundo real incidida entre os olhos recompostos, os olhos desprovidos e os olhares avulsos. Trêmula, a janela responde a força que o vento faz. E a luminária me esquenta um lado do corpo, em especial. A garoa que cai, gradativamente, dá som ao silêncio implícito no quarto, mas enegrece mais a noite.
O ranger e o chorar de coisas, o passar da hora... Agora cantam sob outro volume anunciando a existência do silêncio sóbrio e comovido consigo.
São três e vinte e duas da manhã.